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Showing posts from March, 2009

No meu peito

Não chores... Mas se tiveres mesmo de chorar, aninhar-te-ei no meu peito. Aqui, há tantas dores iguais às tuas. Não chores... Mas se tiveres mesmo de chorar, levar-te-ei à beira mar. Ali, há tantas lágrimas iguais às tuas. Não chores... Mas se tiveres mesmo de chorar, chorarei contigo. Bem sabes que as tuas dores são as minhas. Não chores... Mas se tiveres mesmo de chorar, pedir-te-ei para não chorares. É que o mar não é feito só de lágrimas e eu... Eu preciso que me sustenhas para poder então aninhar-te no meu peito.

A visita

Falaram-me tanto da sabedoria de Nha Clara e, agora, defronte a ela, não conseguia dizer nada. Sei que descera do Hiace e que, destemida, subira a ladeira até à casa térrea de Nha Clara. Porém, mal a vira sentada no mocho, à porta de casa, perdera toda a coragem para as perguntas prementes que tinha dentro de mim. Debruçada sobre um enorme balaio, Nha Clara descascava, sem pressas e metodicamente, vagens de feijões. Tirava uma vagem do balaio, puxava a linha, às vezes, com a ajuda de uma pequena faca, e, cuidadosamente, retirava os feijões e, sem desviar o olhar do balaio, deixava-os escorregar da sua mão e cair numa panela, colocada no seu lado direito. No seu labor, ainda não levantara os seus olhos para me ver e eu... eu hesitava em cumprimentá-la. Sentia-me mais segura a mirá-la e os seus gestos tranquilos aquietavam-me. Finalmente, pareceu ter sentido a minha presença, pois levantou o olhar, colocou a mão direita sobre os olhos e, com a mão esquerda, sem hesitações, fez-me sin

Bem-vinda

Não sabia. Não sabia que existias. Não sabia. Não sabia sequer o que almejavas - para mim -. Mas tu... Mas tu sempre soubeste tudo sobre mim. Quem eu era, quem eu sou. Eu? Eu não sabia nada disso sobre mim. E neste silêncio, nesta quietude, Eis que irrompeste do fundo de mim Livre e triunfante! Sê bem-vinda. Não sabia que existias - em mim -. Sê bem-vinda. Sai da minha sombra. É que não sabia que és a razão pela qual eu existo.

Os amantes

Para os amantes, o sol sumia vagarosamente no horizonte e o mar inflamava-se e fundia-se nos tons de vermelho e laranja do céu. A brisa trazia consigo o cheiro forte a maresia e Lígia, fechando os olhos, inspirava sofregamente e apertava com firmeza a mão de César. O rosto, luminoso, deixava transparecer a sua alegria interior por sentir novamente o cheiro característico do mar, transportando-a para a sua infância passada à beira-mar. Sem querer quebrar a ligação com o seu passado, Lígia, ainda de olhos fechados, aproximou a mão de César dos seus lábios e beijou-a ternamente. Com o pensamento perdido nas tonalidades do céu e do mar, César sorriu ao sentir a suavidade do toque dos lábios de Lígia. Pausaram a caminhada pela Marginal e César repousou o olhar em Lígia, que permanecia mergulhada nos cheiros da sua meninice. Maravilhado, César continuou a olhar para ela, tentando absorver a energia que irradiava dela. Queria entranhar-se nela e conseguir encontrar essa sua avidez inesgotáve

Silêncio, por favor

a palavra é de prata, mas o silêncio é de ouro. Leão Tolstoy, in Guerra & Paz No Domingo passado, no programa de rádio " Speaking of Faith ", produzido e apresentado por Krista Tippett e emitido pela National Public Radio , a depressão foi o tema abordado. O que prendeu a minha atenção ao programa foi a conversa da apresentadora com Parker Palmer . Imerso no seu quadro depressivo, ele admitiu à Krista que se afastara totalmente das pessoas e da natureza, i.e. perdera a capacidade de desfrutar de uma tarde soalheira, de admirar uma flor... Falou disso, exemplificando que muitos amigos, numa tentativa de o ajudarem a sair da depressão, iam visitá-lo e diziam-lhe: Mas porque estás assim? Olha como está uma tarde bonita lá fora! E essas visitas tornavam-se muito penosas porque para ele a vida, nesse momento, não fazia sentido e lembrarem-lhe disso só o infelicitava mais. Elogios sobre a sua pessoa, o seu percurso profissional e pessoal, só o faziam sentir que tinha defraudad

Homero & Maria

- Tem sido uma longa caminhada, minha amiga. Homero trajava roupas claras, parecia até que todo ele era pureza. A sua barba branca, comprida até ao peito e habitualmente em desalinho, estava particularmente revolta nessa tarde de sol abrasador mas com uma brisa suave a correr pelas ruas da cidade. Maria não sabia a sua idade, nem a sua proveniência, porém essa barba branca e um olhar de tranquilidade e de apaziguamento permanente e que só a experiência de vida confere às pessoas, diziam-lhe que Homero já percorrera o mundo, enquanto ela sentia que estava finalmente a dar os primeiros passos na estrada da vida, sem buscar o apoio num suporte ao alcance das mãos. Quando a conversa entre os dois discorria de forma amena, ela quase que se atrevia a perguntar-lhe a idade, a sua origem, o seu percurso de vida... Mas inibia-se sempre, por medo de ofendê-lo, de entrar num campo que ele nunca tinha mostrado disponibilidade em abordar. Nem sabia o seu nome, tendo começado a tratá-lo por Homero e

Como foi

No sussuro da tua voz como uma carícia, explorando as linhas do meu corpo. Nas palavras suspensas por silêncios densos onde tudo é sentido e nada é falado. Fizeste-me tua. -

Promessas

Promete-me que todos os dias irás mais além que serás ponderado nas escolhas que serás intrépido nas demandas que sentirás todos os dias que foste mais além. Promete-me ... não, espera... Promete a ti próprio que serás sempre fiel ao teu EU. -