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Showing posts from November, 2007

Choro silencioso

- Porque choras? As lágrimas deslizavam suavemente pela face. Não era um choro convulsivo. Na verdade, nem sentia que estivesse a chorar. As lágrimas caíam, discretamente, desaguando nos lábios, deixando-lhe com um sabor a mar na boca. - Porque me afastas de ti? Recostou-se no sofá, abraçando-se. Como explicar-lhe que a vida tinha-lhe ensinado a apoiar-se em si própria? Como dizer-lhe que sabia que cada pessoa era um mundo e que, provavelmente, quando verdadeiramente precisasse ouvir uma voz amiga, essa voz não surgiria. Abriu os olhos, sorriu e disse: - Estou bem. Não estou a chorar. São lágrimas de apaziguamento. O encanto acabou. Estava sozinha na sala. Limpou as lágrimas com as mãos e levantou-se decidida. Caminhou até à janela e ficou a observar as árvores. "O Inverno está a chegar." pensou. "Vou sentir saudades de ver estas árvores com flores, cheias de vida. Agora é o tempo do recolhimento". O telefone tocou. Era uma voz amiga. - Maggs -

À procura

Sôfrega, procuro na multidão, não um rosto conhecido não um sorriso cúmplice não um olhar compreensivo mas vestígios da solidão que em mim vivem. Talvez, assim... não me sinta só, com a solidão por companhia. - Maggs -

Opções

Mergulhada nas profundezas, é onde quero permanecer. A superfície, não me bastando. Para além do que a vista alcança, é onde quero perscrutar. A proximidade, não me saciando. Em transformação permanente, é como quero viver. - Maggs -

Antecipação dos rituais de celebração

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Desde que aqui cheguei tento manter-me a par dos " rituais de celebração " mas torna-se difícil acompanhar o ritmo americano. Consigo depreender a vinda de um ritual de celebração através dos objectos colocados na montra de uma das lojas dos amigos do hospital, que fica mesmo ao lado do elevador que me leva ao departamento de radioterapia. Ainda o Inverno se encontrava bem instalado e sem vontade de ceder à Primavera, a montra mostrava-me objectos alusivos à chegada da estação das flores. Em particular, uma tabuleta de cores bonitas com a seguinte frase: "A Primavera chegou!" Sempre que lia essa frase, sentia uma grande angústia e um dia vi-me tentada a entrar na loja e perguntar à menina onde é que parava a Primavera porque eu continuava a ver neve por toda a parte! Em pleno Agosto, o oposto acontece: a montra reveste-se em tons outonais e começam a celebrar o dia das Bruxas. Antes do dia 1 de Novembro, já tinha começado a antecipação do ritual "Acção de Graç

Véu

Estranhamente me transformo me transcendo mas não me estranho. O que resta agora? As minhas dores - que são as minhas. As tuas dores - que são as tuas. Efectivamente apartados desconhecidos mas não o estranho. O que dizer? as nossas fragilidades expostas ao cair do véu as nossas incompreensões evidentes nesta nudez crua. Claramente me transformei me transcendi liberta me sentindo. O que fazer? Partir, sem hesitações. Porque hesitante tens sido tu. - Maggs -

(Des)arranjo musical

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Orquestra Sinfónica do n.º 608 de uma rua de Omaha As janelas do meu quarto e da minha sala estão mesmo defronte desta orquestra que me proporciona momentos musicais praticamente 24h/24h. Obviamente, dou por mim à espera dos momentos de pausa musical porque não faz o meu estilo este género musical. Talvez por não apreciar este género, o instrumentista mais afoito está posicionado mesmo ao lado da janela do meu quarto. Um dia, fui investigar o "dono" deste instrumentista e descobri que pertencia ao meu vizinho do lado. Se tivesse matutado um pouco mais, nem teria valido a pena invadir o espaço da orquestra porque o meu vizinho gosta de fazer coro e presentea-me com umas gargalhadas bem agudas, em sintonia perfeita com o som difundido pela orquestra. Há cerca de dois meses, houve uma nova aquisição - o meu vizinho de cima. Esse deve pensar que os instrumentistas pertencem a uma banda militar porque as suas passadas lembram-me a marcha dos militares para além de fazer com que t

Guerra & Paz

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Sergei Bondarchuk realizou a " versão russa " de Guerra & Paz, em 1968. Em 1956, a " versão americana " tinha aparecido, sob a direcção de King Vidor. A versão russa acompanha-me sempre, tendo escrito " Valsa " com as imagens do filme a povoarem a minha imaginação. Esta obra cinematográfica tem a capacidade de colocar em tela os pensamentos de personagens fulcrais da obra, nada mais sendo do que as inquietações do próprio Leão Tolstoy. Aos catorze anos, vi as versões russa e americana na televisão portuguesa. De seguida, li a obra. Desde essa altura, já perdi a conta do número de vezes que reli Guerra & Paz. Quando vivi em Inglaterra, tive a oportunidade de comprar em VHS a versão russa. Como estes personagens estão aqui comigo tão presentes, sinto que quando estiver em Lisboa, vou ter de rever esta versão russa. Na versão americana, Peter Fonta faz de Pedro Bezukov. Mas, Pedro é um homem corpulento que não sabe o que há-de fazer com o seu corpo, c

(Re)aprendizagem do amor

Desaprendendo os afectos, o vazio por companhia na visita da solidão. Chegará o tempo para a (re)aprendizagem do amor igualmente a aprendizagem das suas nuances claramente a sua natureza se revelando - nada mais do que uma necessidade egoísta. - Maggs -